7 de novembro de 2016

(Auto)crítica à Esquerda

                                     Adianto que entendo estarmos caminhando para a superação da dicotomia direita/esquerda, que considero ultrapassada. Utilizei essa divisão, no entanto, por razões óbvias de desenvolvimento do meu raciocínio e porque, afinal de contas, a dicotomia ainda existe na prática, em relação à alguns assuntos cujas pautas encontram-se nitidamente opostas.

Não sou expert em política, mas tão somente uma observadora atrevida do comportamento humano, de maneira que atribuo legitimidade a mim mesma para fazê-lo pelo simples fato de também o ser.

Minha mãe sempre diz “temos dois ouvidos para ouvir e apenas uma boca para falar”. Aqueles que me conhecem sabem que falho bastante nesse sentido, já que minha boca fala por três, com o volume de cinco. Apesar disso, neste momento político atual, tenho feito um esforço maior para adotar essa lição, na tentativa de não me apossar de opiniões tão rapidamente em dias tão críticos. Estamos todos vulneráveis e, por isso, escutar o outro lado, agora, me parece ser mais saudável do que produzir opiniões (e textões) de forma desmedida - ou desesperada. Contudo, cairei na tentação de romper este esforço pelo silêncio por acreditar que, desta vez, trata-se, também, de uma autocrítica.

É que, frequentemente, nos últimos dias, tenho me lembrado de 2013, quando protestos contra o aumento da passagem do transporte público levou uma parcela da população às ruas. No começo, moleques magrelos e pardos queimavam pneus no terminal da Praça A, revoltados. Mesclava-se nesse cenário os movimentos estudantis de esquerda que, apesar de marcarem presença todos os anos nas ruas, com a pauta do passe-livre na garganta, encontravam-se, de alguma maneira, mais agitados, naquele ano.

Lembro-me que, em 2013, estive em Brasília durante um dia inteiro e, ao chegar em Goiânia, passando pela Praça da Bíblia, fui surpreendida ao ver ônibus sendo incendiados. Desci na Faculdade de Direito da UFG, assustada, e pouco tempo depois soube que os manifestantes se refugiaram no pátio da Vetusta, perímetro de jurisdição Federal que serviu como abrigo contra a resposta violenta da PM. Nesse dia, inclusive, um cartaz singelo do portão daquela faculdade, que continha os dizeres “proibido a entrada de carro e moto” amanheceu acrescido de um trecho: “proibido a entrada de carro e moto E POLÍCIA”. Particularmente, registrei este fato como uma memória emocionante.

Lá em São Paulo, a Avenida Paulista encontrava-se igualmente frequentada por protestos de esquerda contra o aumento da passagem de ônibus, e lá repetiam-se as agressividades da Polícia Militar contra a integridade física de uma brava juventude. Num destes dias, Arnaldo Jabor soltou um célebre comentário a respeito da violência dos protestantes. Referindo-se ao ódio contra as cidades, Jabor afirmou que tudo aquilo não poderia ser “só por 20 centavos”.

Foi o suficiente para engrossar o coro das ruas. A partir de então, a vontade de responder que não era “só por vinte centavos” dobrou ou triplicou o número de jovens nas ruas gritando que não eram só por centavos, mas o que esses centavos significavam para o país, de onde eles vinham, para onde eles iam. Crescendo como um ser vivo, o “Gigante” teria acordado e digivoluído de “protesto” para “manifestação”.

Sobre isso, eu escrevi anteriormente. Faço algumas ressalvas sobre minhas palavras, inclusive. Mas, de maneira geral, A Revolta dos 20 Centavos levou jovens com outros anseios a caminharem ao lado do movimento passe livre. Entremeando-se ao movimento, trocaram o grito de guerra por clamores de “sem violência”, ampliaram a revolta contra o aumento do preço do transporte público e levaram-na para a educação, saúde, Dilma, Marconi e, a propósito, para a corrupção.

Era a direita transformando um movimento de esquerda em algo também seu.

Como já disse, naquela época, fiz duras críticas. Algumas bastante imaturas e outras que ainda considero pertinentes. Contudo, no contexto atual, observei o fenômeno por outro ponto de vista.

É que a esquerda, atualmente - e aqui não me refiro a nenhum partido, nenhuma pessoa pública, nenhum Willys e nenhuma Genro: me refiro a nós, jovens de esquerda, individuais, pequenos e desamparados de representação consistente - nós, esquerda, resistimos a somar aos gritos das ruas que, atualmente, vem deles: os "coxinhas".

Afirmamos, duramente, desde 2014, a recusa em caminhar ao lado de pessoas que clamam por intervenção militar, medidas de extrema direita, massacre das minorias, pautas fascistas e bastante cruéis para os subrepresentados.

No começo disso tudo, na ressaca das eleições, concordava e fazia coro a este repúdio. Jamais dormiria de consciência tranquila depois de ter caminhando pelo meu país ao lado de clamores pelo Bolsomito, Feliciano e Malafaia. Entretanto, assim como na época dos 20 centavos, as coisas mudaram. Temos um estopim. Estamos igualmente decepcionados com o governo. Temos nojo dos governistas que idolatram o Lula e o PT, mas sem perder o nojo das porcarias provenientes dos Cunhas, Aécios e afins.

Porém, ao contrário do que fizeram os "coxinhas", resistimos em tomar as vozes das ruas como nossa. Afirmamos e reafirmamos que aquela é uma manifestação de direita e que a ela não aderiremos.

Nós, que nos julgamos melhor informados, que nos avaliamos como mais politizados, observamos todo o contexto da manifestação pacífica da direita, regada a selfies, camiseta da seleção e boa relação com a polícia; e apenas tememos suas consequências fazendo textões de facebook (alá a metalinguagem hipócrita!).

Aliás, o que eu tenho visto, ultimamente, é uma vontade imensa dessa esquerda, sobretudo, da juventude, de ir pras ruas do seu modo - meio de semana, umas cartolinas, vinagre e muito cacetete no lombo - mas declaradamente afastada da outra parte. Achei interessante, inclusive, quando vi o seguinte recado: “Coxinhas, limpem o catupiry da pista que agora quem vai pra rua somos nós”.

Uma dicotomia ultrapassada.

Os "coxinhas", em 2013, pegaram um movimento com uma pauta bastante esquerdista (subsídio do Estado para passagem dos estudantes) e, ao somarem-se a ela, fizeram com que aquela massa também os representasse, abafaram o que não os interessava e buscaram nela a força para sua voz.

Hoje, 2016, presenciamos afrontas ao Estado Democrático de Direito, tanto na atuação dos Juízes-estrela quanto nas mil manobras repugnantes deste Governo Federal falido, mas assistimos de longe a "lanchonete inteira" tomar as ruas, agarrando-nos ainda à imagem desta ou daquela coxinha estragada, como escudo para não fazermos deste um movimento legitimamente tão nosso quanto: ao ponto transformarmos suas pautas e ampliarmos os decibéis das nossas vozes, combatermos porcos interesses por trás do processo de impeachment e clamores fascistas idiotas que tem buscado seu lugar lá fora.

Nesse ponto, creio eu, estamos pecando. Somente a nossa participação mudará o curso desse rio. Essa luta também é nossa.

Feminismo pela fraqueza

O meu feminismo nunca foi um feminismo pela força. Gosto de todo o discurso do emponderamento, mas sou fatalmente pertencente ao outro lado: Enfraquecimento.

Meu feminismo não é pela desconstrução do romantismo. Pelo contrário: é pela romantização do mundo. É pelo amor sublime que provém das fantasias mais sensíveis da alma. Somente a fantasia de amor eterno sublima-nos deste mundo tão terreno. Desse mundo tão fatal. Tão másculo.

O feminismo não me atraiu pelo direito aos corpos femininos peludos, robustos e poderosos. O feminismo me atraiu pela libertação dos corpos depilados, esguios e frágeis. Pela permissão de errar. Pela permissão de se doer. E chorar. Pelos corações barbudos que choram e se perguntam quem são. E que não choram em silêncio.

É aprisionante ter de chorar em silêncio - oras, todo homem chora. Coração é represa que quanto mais contida, mais ganha força para estourar barragens. Nunca ouvirá de mim um pedido para que pares de chorar. Chore. E assim como canta o Fagner no momento mais escuro daquela noite ébria e solitária: chore "por todos os sentidos".

Permita-se jorrar.

Só a fraqueza é a verdadeira força. A água é a representação mais fiel da força das emoções. Remete ao que há de mais sensível. Parece frágil, mas se está em contato com o fogo, vira vapor. Se entra em contato com a terra, penetra, ou discretamente insiste por milhões de anos até lapidar as inconveniências mais pontiagudas das pedras. Embaixo d'água não é possível respirar: o ar, o raciocínio, a lógica, não sobrevivem onde a emoção deságua. A água que parece frágil, adapta-se a tudo, e nunca é destruída.

Água é substantivo feminino. Feminilize-se.

Jamais ouvirá de mim: aguente firme. Não aguente. Definhe-se até padecer, e só então estará reconstruído. Maternalize-se. Floreie-se. Vulnerabilize-se. Desgaste-se em um pedido de desculpas. Mande áudios para a janela errada. Grite de saudade. Borre a maquiagem. Falhe no discurso. Perca a queda de braço. Recue. Abra mão. Não é preciso sermos tão machos.

Romantize-se.

Pois o verdadeiro "ser" está por trás dessa euforia descontrolada, institucionalizada para se esquecer do gosto de mar que desce aos lábios. "Ser" é oceano.

Quebrante-se.

O mundo exige força demais. Poder demais. Sabedoria. Virilidade. Potência. Uma masculinidade que corrói. Necessidade de vencer sempre, que consome. O ser humano não é o gladiador: é o que resta quando ele se despe da armadura. Do escudo. Da segurança.

Seja nu.

Sobre a Fátima, o Willian e os fins



Faltou que eu virasse do avesso, de tanto rir dos memes que envolviam o fim do casamento da Fátima Bernardes e do Willian Bonner. Enquanto me divertia com as piadas, entretanto, ouvi algumas coisas que me chamaram a atenção.

Primeiro, vários amigos dizendo que estavam sentindo culpa por rir da desgraça alheia. Segundo, criticas por estar rindo sobre o fim de uma família. Terceiro, amigos realmente apreensivos sobre não poder mais acreditar no amor.

Ora, me pergunto. De qual desgraça, afinal de contas, eu ria? Eles comunicaram que continuavam amigos, tiveram três filhos lindos e aparentemente tem toda estrutura necessária para lidar bem com os contratempos que, fatalmente, virão. Desgraça por quê, então? Por não ter sido eterno? Que mania besta, essa do ser humano, de exigir eternidade das coisas, nesta vida tão finita. Fins não são, necessariamente, desgraças. A vida é cíclica, e não há nada mais natural nessa vida do que fechar ciclos.

Na verdade, o grande sofrimento existe justamente porque não aceitamos que a vida é esta dura realidade que enxergamos. As pessoas são falhas. As pessoas mudam de ideia. As pessoas brigam. As pessoas mudam de sonhos. Somos pessoas. O que causa dor, não é o amor, mas o ego (ferido). Amor não dói.

Envelhecer ao lado de alguém não é romântico. É algo romantizado por nossa cultura, que nos imerge em uma fantasia, uma ilusão de eternidade quando, na verdade - sejamos sinceros - dificilmente os casais envelhecem juntos. E aqueles que o fizeram, raramente o fizeram por amor. Se eu não desejo isso pra mim? Ora, mas é claro! Mas não seria muito cruel com todos nós, humanos, acreditar que o amor só "deu certo" quando se encaixou em uma exceção tão rara?

Isto não é um culto à liquidez das relações modernas - não. Mas é necessário ter coragem para aceitar que muitos casais, nos tempos antigos, envelheciam juntos, mas amargando traições e até violência doméstica em nome da manutenção das aparências e de uma falsa estrutura de família. Isso sim, é triste. Isso sim, é desgraça.

Romantizar eternidades e demonizar o fim é colaborar para relacionamentos abusivos. É reafirmar a ideia de pessoas vivendo insatisfeitas, na busca de um ideal. É recusar renovações - e até recomeços, dentro do fim - porquê não?

Veja, eu não desacredito no amor. É bem o oposto. Aceitando que a vida é cíclica, que vivemos fins de todas as formas, todos os dias, nas nossas vidas, todas as histórias podem se tornar grandes amores. Acredito em vários "amores da minha vida". E vivo todos como se assim fossem. A graça dessa vida - a vida real - é poder sentir que uma aventura de 6 meses pode ter a mesma importância de um casamento de 26 anos. Cada um pelo seu motivo, pela sua história. E todas terão um fim: "Quem sabe a morte, angústia de quem vive / Quem sabe a solidão, fim de quem ama".

Aproveitando a referência a Vinícius de Moraes, devo dizer que sempre me intrigou que o meu poema preferido dele seja frequentemente alterado pelo jargão popular. Ele diz "que NÃO seja imortal, posto que é chama / mas que seja INFINITO enquanto dure." Contudo, reparo, por aí, que as pessoas volta e meia acabam dizendo "que seja ETERNO enquanto dure" Não. Vinícius não era poeta de eternidades. Não somos seres de eternidades. Não forcemos a barra. Somos seres fadados a fins - muitos fins - e recomeços. E não há nada, absolutamente nada de desgraça nisso.

É, na verdade, muito injusto conosco - possuímos corações tão vulneráveis, afinal - exigir que só seremos felizes se atingirmos a perfeição do para sempre. A vida é finita. E isso não é triste - isso é um convite incansável do Agora para que só o hoje seja, de fato, infinito (em plenitude).

Da mesma maneira, o fim de um casamento não é, de modo algum, o fim de uma família. Não sejamos tolos. Nenhuma família é aquela do comercial de margarina. Família, mesmo, é recheada de tios que nos presenteiam com novecentos primos, porque juntaram os filhos de uns três casamentos diferentes, um outro tio solteirão, uma outra tia que não é irmã de ninguém, mas se casou com o tio e apesar do divórcio todo mundo ainda ama e convive, e aquele ex-cunhado que ainda divide a guarda do cachorro da sua irmã. E isso não pode ser uma infelicidade. Essa é a vida real. E isso é uma delícia, sim.

A lição mais incrível que me foi ensinada no curso de Mediação Judicial foi a missão de passar para os casais em processo de divórcio que aquilo não era o fim de uma família - apenas uma reordenação. Ninguém deixa de ser pai, ninguém deixa de ser mãe, nunca. O amor entre um homem e uma mulher jamais será suficiente para limitar algo tão incrível quanto o amor que liga uma família.

E, da mesma maneira, é muito injusto, conosco, fazer acreditar que a única família feliz é aquela com eu, você, dois filhos e um cachorro.

Desgraça é ter de manter leis conservadoras pelo bem da família tradicional brasileira. Desgraça é não poder rir de nossas situações cotidianas, mesmo quando temos uma criatividade invencível de projetá-las em um acontecimento público de duas pessoas famosas. Desgraça é esperar, a vida toda, pelo amor perfeito, e se rebater burramente contra os inadiáveis fins.

Desgraça é desejar perfeição.

A vida, ela é só Graça.

29 de outubro de 2014

LUTO

"Está aí uma coisa que nunca saberei nem compreenderei - do que os humanos são capazes"
A morte, em A Menina que Roubava Livros 





Quando vejo a palavra LUTO, penso no meu tio, que se foi ano passado. Quando ouço a palavra LUTO, lembro da minha querida amiga perdendo o pai antes de ela se formar. Penso em uma outra amada amiga que perdeu o pai ainda criança. Quando leio a palavra LUTO, penso no meu amigo perdendo a avó para o câncer. Penso na minha avó, que não conheci.

A dor do luto é a dor mais profunda que se pode sentir. É uma dor de saudade eterna (como pode uma saudade que nunca acaba?!). É a dor da única certeza que temos na vida. Não adormece nunca. Dorme e acorda do lado. É a dor que vem depois do último suspiro da esperança. A dor do LUTO está em cada canto da casa, em cada cheiro, na cadeira vazia. A dor do luto é dor doída, é uma dor incrivelmente íntima, totalmente particular. Cada um tem o seu luto porque cada um terá sua despedida de uma maneira. A dor do LUTO não sai se anunciando por aí. É a dor de assinar o decreto de adeus irrecuperável.

Quando conta a história de Liesel, a morte alerta que não sabe ser simpática. A morte causa uma dor revoltante, um grito que jamais acaba de sair da garganta. O último adeus nunca quer terminar. Não desejo pra ninguém a sina da Menina que Roubava Livros. Ninguém precisa ser visto três vezes pela morte para saber a imensa dor do para sempre: LUTO.

Quando vejo as pessoas decretando LUTO porque Dilma venceu as eleições, sinto que uma parte de mim foi invadida. Desrespeitada. Como se zombassem da minha dor. Como se fosse uma saudade banal.

Um processo democrático - construído, inclusive, sobre o luto de famílias que tiveram vidas ceifadas pela Ditadura Militar - não deve nunca ser comparado com a morte. A dor de receber um resultado que representa a vontade de mais da metade de um país não será jamais equiparável à dor do Adeus. O LUTO nunca será fruto da vontade de ninguém.

Entendo a dor de quem discorda tanto, tanto!, dos métodos da presidente Dilma, que sente de verdade uma decepção e questiona o futuro do país. Mas, desculpe, sua dor não pode ser tamanha. A dor do LUTO é a maior de todas e não cabe aqui. Não merece isso aqui. Não brinque com o LUTO, não subestime o LUTO de uma mãe que viu o filho morrer.

Morte. Um resultado irreversível. Um nó no estômago que nunca desatará. O Brasil não está de LUTO. Você não está de LUTO pelo país. Você pode estar decepcionado, preocupado, extremamente angustiado, triste de verdade, eu respeito. Mas você não está de LUTO.

Porque nada pode se comparar a perda de um ente querido. Porque esse resultado foi a vontade da maioria. A morte não é. Porque pode haver um lado bom. Na morte não há. Porque não é irreversível. A morte é. Porque veio de um processo democrático e justo. A morte jura que é justa (eu duvido). Porque você colocou a cabeça no travesseiro e dormiu. Quem está de LUTO não. Porque você não duvidou da justiça Divina. Quem está de LUTO ousou.

Não seja hipócrita. Decretar LUTO porque seu País não será governado pelo candidato que você deseja soa mais como uma reação de uma criança birrenta. Uma criança mimada e ingênua que acreditou quando a TV disse que revolução se faz nas urnas. Que acreditou que os dois candidatos tinham diferenças astronômicas (ah, e que criança ingênua...)!

Soa como se fosse o primeiro não que você recebeu na vida (para alguns não duvido que seja). Soa como imaturidade para a democracia.

Respeito sua dor, seu desespero. Respeito sua preferência política. Respeito sua revolta e de certa forma a compreendo. Respeito se você acredita que decidiram erroneamente.

Mas, por favor, respeite a saudade de quem se despediu para sempre. Essa dor é eterna, como a Morte.

8 de outubro de 2014

BURRO É QUEM ME CHAMA

Quando eu tinha meus 11/13 anos de idade mais ou menos, no auge da estupidez de pré-adolescente, existia, no horário do recreio, duelo de "tiradinhas".

"Burro é quem me chama"
"Eu durmo na cama cê dorme na lama"
"Cavalo que te ama"

Depois que passei da fase, olhei pra trás e, junto aos demais daquela época, reconheci que era um estágio bobo de quando surgiam os primeiros coleguinhas usando aparelho nos dentes e que teríamos que aprender a conviver com as diferenças e a dificuldade da aceitação.

Já grandinhos, fomos todos aprendendo que aquela agressividade gratuita guardava na verdade uma explosão de hormônios e novas  experiências que, ao serem mal interpretadas por nossas cabeças ingênuas, se transformavam na mais pura e natural "aborrecência". Coisas que se curam com a maturidade.

Ou talvez não. 

Porque, dez anos depois, quando já sou chamada de adulta por aí, me deparo nesse corredorzão que é o facebook, cheio dessa agressividade gratuita de novo: estamos nas vésperas do segundo turno das eleições.

A discussão política já se encerrou faz tempo. Talvez antes do término do primeiro turno. Temos agora um duelo de tiradinhas dos crescidinhos.

Já me cansei de explicar, em comentários, qual foi a origem dos protestos de 2013 e porque as pessoas ACHAM que ele deveria ter feito diferença agora. Não adianta. As pessoas não querem entender a origem e o contexto das coisas.

Já me cansei de explicar porque essa eleição me remeteu a um sentimento de fracasso tao profundo - desde a eleição do congresso mais conservador desde 1964 às opções " maravilhosas" que teremos em segundo turno em nível estadual e federal. Não adianta. Ninguém quer entender.

As pessoas querem estar certas. Elas não querem saber os defeitos dos candidatos que escolheram. Elas querem estar certas. Elas não querem ler sobre a economia, distribuição de renda, impostos ou educação. Elas querem estar certas. Elas não querem prestar atenção no que eles dizem, não só porque eles não dizem nada, ié ié. Mas porque elas querem estar certas.

A discussão entre petistas e tucanos já virou um grande "burro é quem me chama", " eu durmo na cama cê dorme na lama" já tem um tempo. Já está vazia e cheia de falta de bom senso.

A discussão politica me engrandece, me empolga. Eu gosto de saber das coisas. Aviso para todos que sou leiga para que todos queiram sempre me ensinar algo novo. Mas o mundo - já disse algum grande sábio da internet, nos tempos do aplicativo Lulu - "o mundo é uma grande quarta  série".

E na quarta série ninguém ainda está preparado pra eleger presidente. Mas estão todos extremamente afiados para o duelo de tiradinhas.

E burro é quem me chama.



20 de setembro de 2014

A fossa é produtiva



O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
(Fernando Pessoa)




 Oi, voltei. Receba-me como quiser, será justo. Estive ausente por tanto tempo! Mas olha, eu nunca te esqueci. Estive sempre pensando nas coisas que poderiam ser ditas a você. Até me perguntaram como você estava, inclusive. Esbocei um sorriso para dizer que você sempre esteve aqui, no mesmo lugar, e que estava bem.

Te fiz colorido como minha alma, e você tem essa aparência infantil, infantil como minha essência. Você é uma tradução de mim, uma exposição que eu escolhi. Dediquei a você cada sentimento que já conheci. Você é o tempo que eu escolhi para me voltar para mim, entende?! Perdão por te deixar de lado. Eu vou te explicar, me deixa explicar o que aconteceu. 

É que é a fossa que faz poesia, repara bem. Repara nas músicas sertanejas, nos sambas. Repara como eles tocam mais quando se queixam da dor. Repara como as letras do Renato são tristes. Repara naquela música que eu adoro "que todo grande amor, só é bem grande se for triste". Pode reparar até na foto de quem está na fossa. Dá identificar pela legenda: sempre haverá um verso profundo junto à selfie do dono de um coração que vai mal das pernas. Isso é porque é a fossa que nos faz colocar o pensamento pra fora. Você vê?

A fossa é escandalosa, está a todo tempo pronta para dizer as coisas. A fossa é um clamor das expressões, uma súplica para sair de dentro de si, de colocar pra fora, de jogar a culpa em alguém. De procurar, em qualquer linha, uma entrelinha que dê sentido para aquela dor. Não é a solidão, não é o sofrimento... É a fossa. Fossa tem nome próprio, não existe sinônimo. É o verso doído do refrão da música. Aquela parte que dá vontade de cantar bem alto. Que faz a gente bater a mão na mesa e virar um gole. Sabe?! Isso é fossa.

 Naquela última vez que eu apareci - uma fossa das feias - eu estava até chorando, mas você nem viu. E, desde o dia em que eu curei minha última fossa, eu sumi. Por isso eu sumi. É que com o passar do tempo, eu fui ficando tão bem! Eu fui para um lugar maravilhoso.  Estive com ótimas pessoas (depois te falo delas).  Isso tudo me trouxe muita paz. E quando o coração está em paz, vou te contar, tudo parece mais fácil. E de repente eu já não tinha muito pra dizer. Estava abrigada no silêncio calmo da minha alma.

Dentro do meu silêncio, eu queria falar sobre a copa, sobre as eleições, sobre amizades, sobre decepções, sobre o trânsito, mas estava tudo tão calmo que eu não precisava dizer nada. Eu via as coisas, no caos, entrando em minha mente e eu apaziguando-as sem precisar das palavras. E fui deixando levar. Eu só fui vivendo fui vivendo fui vivendo fui vivendo e esqueci das vírgulas. E era nelas que você se escondia. Nesse tempo seu, que era tão meu. 

E depois de um tempo de paz, vim pra te dizer, eu estou na fossa. Porque eu desaprendi a me ouvir. Eu vejo as coisas acontecerem, penso sobre elas e não sei qual a minha opinião. Logo eu, que adoro dar um pitaco, que sou cheia de coisas pra dizer, cheia de histórias para contar, calei minha tagarelice dentro da minha paz. E sabe "qual a paz que eu não quero conservar para tentar ser feliz"? A paz que me cala. Porque eu nasci para falar, falar muito, e você nasceu da minha necessidade de me expressar.

Estou muito feliz por estar na fossa novamente. E por isso, eu voltei. Peço, humildemente, que você aceite a minha volta.


26 de setembro de 2013

Velejar

Era mês de agosto, baixa temporada na praia quando o Jangadeiro me levou a um passeio por 15 reais. Ele me apresentava as curiosidades do mar, passeando sobre as ondinhas daquele azul maravilhoso, mostrando o céu, os pássaros, a vegetação, a pedra no formato de cachorro, a outra no formato de coelho, mostrando os mariscos deliciosos que eu precisava provar e que tinha lá naquele bar da frente atrás dos coqueiros.

Ele usava uma bermuda e uma camiseta manga longa pra se proteger do sol, um boné e a pochete em que carregava o dinheiro dos turistas que pagavam pelo passeio.

Fui pra longe da praia, lá no meio da água onde estava fundo porque a maré estava alta e era inverno. E tudo me encantava. Me encantou o mar, o recife, os peixes, os barcos, aquele horizonte distante mais maravilhoso do mundo. Me encantava como tudo era extremamente azul, calmo e quente, como aquela pedra realmente parecia um cachorrinho no meio do mar tomando banho de sal.

Mas nada, nada me chamou mais atenção do que uma fala daquele jangadeiro, que entre muitas histórias que contava sobre aquele lugar, me soltou: "essa é minha profissão! Chego em casa todo dia estressado, cansado desse escritório, dessa gente feia, desse lugar feio! Hahahaha"

Reparei que quando ele riu, faltava-lhe uns dentes. Faltavam dentes, talvez um bom carro, talvez faltasse uma casa com mais conforto, talvez faltara até escola, mas não lhe faltava nada. Aquele homem não tinha nada e tinha tudo.

Voltei pra minha rotina e nunca esqueci da fala daquele senhor. Vai chegando o final da semana e o cansaço acumulado vai pesando sobre os ombros. Mas sempre me lembrando do Jangadeiro, no seu escritório; que com uma frase, uma brincadeira, me põe, até hoje, a enxugar umas lágrimas que caem quando eu me pergunto o que é realmente a felicidade.

E em busca de quê é esse esforço todo. E qual a razão de tantas metas. E por que os ternos. E por que os pronomes oblíquos. E por que o trânsito. E po rque tanta pressa. E qual a razão pra se chegar tão longe, se o azul do céu também está tão perto dos meus olhos.

Penso, me angustio, me renovo e burramente, sigo no mesmo ritmo. E sempre lembrando do Jangadeiro. Que com um honorário de 15 reais esfregou nas minhas fuças o que é um escritório bom de verdade.





21 de junho de 2013

Um protesto de aparências

Não fui a um protesto. Fui a um evento social. Estou totalmente desiludida com o que vi hoje em Goiânia. Até hoje a tarde estava absolutamente deslumbrada com o espírito de civismo que finalmente teria dominado  os jovens da geração 2000. Civismo! Luta pela Pátria! Devoção ao interesse público, patriotismo. Hoje até comentei com uns colegas mais cedo: estamos todos tão românticos! - Acho que aí residia um grande perigo e eu não havia notado. Nacionalismo romântico, enfatizar a glória de ser brasileiro - é a hora?! Foi pra isso que fomos às ruas? Festejar?

Não senti Civismo hoje. O que eu senti quando estava lá, no meio do povo, foi uma apavorante falta de foco sobre o que reivindicar. E digo mais - falta de REVOLTA. Quando o protesto era pequeno, ele era mais violento. E, ora, dou razão.   Aqueles que deram início a tudo não tem tempo para palavras e idealizações políticas e nacionalistas. Tem um péssimo terminal de ônibus em condições DESUMANAS à sua espera, para frequentar, todos os dias, isso sim. Ali, nas latas que carregam seres humanos como sardinhas enlatadas, nasceu a ira que deu início a um protesto cheio de ódio pelo preço do Transporte Público.

E essa revolta foi ganhando desenhos, líderes, resultados e evidência. Aos poucos, muita evidência. Daí em diante, conhecemos o caminho - foi ganhando as proporções que vemos hoje. Mas o sentimento de revolta do ponta-pé inicial não ganhou as mesmas proporções. Muitas pessoas que tinham MEDO!, sim, medo daquilo que surgia nos primeiros movimentos, hoje tomaram o movimento como seu. É válido, mudar de ideia é saudável e muito bem vindo - desde que se tome para si o protesto como um todo, e não que se invada com um sentimento mais raso de quem não vive a dor na própria pele ou tem outra bandeira para levantar.

Não vi hoje, ao meu redor, ninguém sinceramente revoltado com a situação do Brasil. Ninguém cantava em coro, não mais que por 1 minuto.  Nenhum grito de guerra ia adiante por muito tempo. Vi gente cantando musiquinhas de festa. Vi gente achando estar num filme nacional do cinema e cantar "eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor". Não é assim! Estamos indo atrás de coisas sérias, gravíssimas! E as pessoas que estão dando VOLUME a isto tudo estão lá por moda. Sim, estão. Instagram, hasthags, fulano vai por que todo mundo vai. Isso foi evidente, ao menos ao meu redor.

Quando eu estava ainda caminhando para chegar no local, encontramos alguns colegas e perguntamos como estava o clima por lá. Ele disse que tava tudo bem mas ah... começaram a chegar uns pivetes. Fiquei incomodada. Queridos, sem esses "pivetes" nada disso estaria acontecendo. São por esses "pivetes" que você, teoricamente, #foiprarua, e não pra postar a foto no facebook. Você foi a rua pra lutar. Luta se faz com o sangue nos olhos! Esses "pivetes" apanharam da P.M. muito antes de você #irprarua, gritar "sem violência" morrendo de medo de uma bomba. Pegaram o protesto que esses "pivetes" começaram, em que  em nome do incômodo que eles viviam todos os dias - no Eixão, no Terminal da Praça da Bíblia, nas linhas que saiam da Av. Goiás às 18:00 -  resolveram incomodar ruas, clamando para que víssemos a situação em que eles se encontravam.

Faltou lembrar o motivo pelo qual todos ali tinham ido pras ruas. Faltou para muitos, sentir na pele a lotação de um 020 ao meio-dia antes de gritar pela melhoria do transporte, ou sentir a fila de um hospital público antes de gritar pela melhoria deles. Faltou garra, faltou dor, faltou fúria. Não é preciso destruir o patrimônio histórico do Centro de Goiânia, mas é preciso deixar entendido que a vontade é essa, é preciso demonstrar violência ao menos no grito. A quem esse protesto de hoje incomodou? O comércio fechou mais cedo, as linhas de ônibus tiveram alterados os seus trajetos.

Mas o instagram estava lá, bombando com cartazes criativos e rostos bonitos, vestidos de branco pedindo paz, ao som da música do Falcão, chamando o pessoal pra vir pra rua. Só gostaria de lembrá-los que o mesmo Falcão canta, em outra música: "Podem até gritar, gritar, podem até barulho então fazer/ Ninguem vai te escutar se não tem fé".

Não tive a sensação de dever cumprido. O gigante acordou, mas apatia dá sono. Quero o próximo protesto cheio de gente com vontade de mudar - e não de mostrar a vontade pros outros.

15 de abril de 2013

A mudança é um processo lento

Passamos pela primeira impressão de que o mundo tem se tornado um lugar onde, por exemplo, as mulheres estão cada vez mais independentes, ou em que os direitos dos homossexuais tem se consolidado, ou em que os direitos das minorias parecem estar garantidos para a efetivação de um futuro muito próximo. Justamente por isso, há quem acredite que já chegou o momento de parar de insistir nessa questão, que já está batido, que saturou. O ser humano enjoa rápido. É tamanho o bombardeamento de ideias; o raio de alcance das ideias tem crescido tanto, que temos essa visão colorida da realidade.
Repare na internet: tanta gente abraça com fervor as lutas da sociedade pós-moderna! Muito se engana, porém, aquele que vê no sucesso da expansão dessas ideias, dessas imagens, na transformação das leis, uma mudança real no cotidiano.
Assim como uma mudança na língua portuguesa, como a reforma ortográfica, por exemplo, ou a lei 12.605 (que determina que as instituições de ensino públicas e privadas devem expedir diplomas e certificados com a flexão do gênero correspondente ao sexo da pessoa diplomada, ao designar a profissão e o grau obtido) não muda a verdadeira construção da língua que, de fato, é feita pelo povo; conquistas alcançadas ao longo dos últimos anos não mudarão em décadas a tradição conservadora de séculos.
Ora, pois há de se notar que, aparentemente, a valorização da mulher no mercado de trabalho, ou as conquistas homoafetivas, e o alcance do direito de tantas minorias tem levado à revoluções na tradição do Direito Brasileiro.
Mas há de se convir que estes avanços ainda não atingiram o inconsciente da coletividade. São alcances ainda superficiais, já que no início do século XX as convicções ainda eram absolutamente outras.
Logo, apesar da aparência de que as lutas feministas ou os protestos homossexuais, por exemplo, estejam garantindo direitos para efetivação em um futuro muito próximo, cabe perfeitamente ainda tratar destas questões, pois não basta que estes direitos estejam garantidos no papel, ou no facebook, ou na moda da juventude contestadora. A Lei, antes de tudo, tem um fim social, e a finalidade dessas leis em questão é de fato muito impactante, de forma que não mudará uma forma de pensar herdado de séculos atrás. São ideais recentes, precisaremos de muito tempo ainda para que a sociedade enxergue essas leis com a naturalidade necessária para dar-lhes a devida eficácia.
O exemplo fica mais óbvio quando levamos essa visão para o âmbito da sexualidade - tanto para sociedade, como um todo, quanto para a mulher, em especial. Há, no mundo atual, uma extremada liberdade sexual, uma aceitação plena, quando na verdade, no íntimo de cada ser humano e, sobretudo, da mulher, o sexo ainda é rodeado por tabus e repressões sexuais herdadas de um passado patriarcal.
Assim, sejam as "mudanças" na língua, na lei, ou no sexo, enquanto elas ainda carregam resquícios de uma tradição secular, não haverá "mudanças". Há de se persistir em conquista aparentemente garantidas, nesses assuntos repetidos, nessa antiga história, sim, e por muito tempo, até que se dê razão de existir às mudanças fixadas no papel.

23 de março de 2013

Paralelismo



"Let my heart go"








Dureza, seriedade, caráter, moral, integridade, dureza. Você é firme, mas ao ponto de não saber reconhecer verdades que não sejam suas verdades. 

Provavelmente você ama muito. Mas cuidado, seu sentimento de domínio não permite que eu veja nenhum sentimento. Moral, dureza, rigor, severidade, pudor. Eu não vejo amor. Não disse que não existe, não disse que não sou grata a ele. Disse que não o vejo. 

Você lamenta por que não preciso mais de você. E não percebe que você contribuiu para isto. 

Tenho sido cada dia mais eu. Cada dia menos você. Cada dia menos seu reflexo. Tenho cada dia menos pudor. Menos severidade. E mais caráter. Cada dia tento nutrir o brio que exatamente você fez crescer em mim. Mas ele não é como o seu. Você se lamenta que eu não seja o seu reflexo. Eu já lamentei que não conseguira ser o seu reflexo. 

Eu me continha, eu me escondia de mim, pra poder ser você. Pra ser aceita, pra me aceitar. E um dia, através de um sofrimento que você desconhece, vim de encontro ao meu eu que era o eu que não tentava ser você.

E vi que eu era uma represa pronta pra jorrar. E jorrei. E tenho te afogado. 
Eu não preciso mais do seu controle. Infelizmente, também abdiquei do seu colo. As escolhas sempre trazem uma renúncia. Eu renunciei a você. E a minha liberdade te consome. E sua tentativa de cercar-me, consome a mim.

Você é o referencial de princípios daquele lugar de onde viemos. E naturalmente, por ter me dado uma visão tão correta da vida, hoje eu estou contra suas convicções. E ser contra suas convicções me faz ver em sua moral, em sua integridade e em seu caráter, aquilo que deforma minha visão de você. A visão que todos tem de você. E a visão que você tem de Deus. 

Meu ego e meu orgulho não cabem no mesmo lugar que sua autoridade. Meu erro não cabe no seu perdão. Seu amor não cabe na falta de amor que há em mim. Não nos encaixamos, e não podemos nos desvincular jamais. 

Dureza, seriedade, caráter, moral, integridade, dureza. E mais uma verdade minha sufocada pela sua. 


12 de março de 2013

Arrogância e poder



O curso de Direito acaba reunindo um bom número de personalidades arrogantes e corruptas. Fiquei com medo de entrar nesse meio, por que quando escolhi o vestibular para que prestar, a minha família foi extremamente contra, justamente por que carregam consigo esse pré-conceito de que as pessoas que conhecem as leis acreditam ser as donas do mundo.

De fato. Impossível sair desse meio sem estar contaminado com o espírito de superioridade que paira entre os ares dos juristas. No final desse ´´semestre´´ de 2012 - que foi em 2013 aqui na Federal - conversando com uma professora querida, desabafei que as vezes me sentia mal de conviver no meio de pessoas corruptas, inescrupulosas e asquerosas, por medo de começar a achar que seria normal ser assim. A  professora e eu conversávamos sobre a carreira que eu gostaria de seguir, e para que eu me informasse melhor, me apontou 2 ou 3 colegas com quem eu poderia tirar umas dúvidas sobre tal carreira, e nesse momento me disse ´´Converse com tais pessoas, elas são pessoas boas, vão te ajudar. Acredite, no direito existem pessoas boas´´.

Carreguei isso na minha mente daquele dia até hoje. De fato, notei que há como encontrar pessoas sérias e com princípios até nos meios menos propícios. Me lembrei das amizades que fiz nesse meio e dos tipos de pessoas que conheci. Felizmente se distingue logo cedo quem são os que deixarão o poder subir à cabeça. Uma pena é notar que as pessoas boas nesse ambiente são a exceção. Uma colega até comentou que se sentia lisonjeada por ouvir de alguém que ela nem parecia que fazia direito. Acho que foi um elogio querendo chamá-la de simples, humilde ou extrovertida. Eu também agradeceria.

Foi também um colega que me inspirou a escrever este desabafo. Quando eu entrei na faculdade, a impressão que tive é de que ele era muito competente. Para o nosso pesar, todo aluno que acaba de prestar vestibular para o mega power very hard curso de Direito na Federal é, realmente, competente. E sabe disso. Acaba, então, acreditando que é a última bolacha do pacote. A mãe fez acreditar nisso, o colégio fez acreditar nisso, o ego faz a certeza de que somos isto. O universo esquece apenas de lembrar que não somos nós os únicos competentes do planeta.

Esse colega é o melhor exemplo daquilo que o poder pode fazer com as pessoas. Não é o único. O ego ingênuo de um calouro que acabou de conhecer o mundo do Direito, se continua sendo massageado, é corrompido. Não há nada mais difícil que exercitar a humildade nessa começo da vida de um jurista.

Houve um tempo em que eu até quis escrever a esse colega algumas palavras. Tivemos uns desentendimentos e me senti na obrigação de dizer ´´Cara, você não é melhor que ninguém aqui, tá? Muito menos que alguém lá de fora!´´ Foi uma época em que eu estava de fato assustada. Todos começaram a notar que ele seria capaz de passar em cima de qualquer um - qualquer um mesmo - pra chegar onde quisesse.

Desisti de tentar ajudá-lo com minhas palavras intrometidas. Até por que ele nada mais é do que um reflexo (um pouco concentrado) da personalidade de muitos que entraram nesse curso. Me calei por que percebi que não era pra ele que eu precisava dizer nada. Ele não era o único a passar por cima de qualquer coisa, aqui. Precisava conseguir dizer algo pro ser humano. Meu Deus, como convencer a todo um mundo do Direito de que o conhecimento não o fará melhor que ninguém? De que os escrúpulos não poderão ser deixados de lado? Será mesmo que todas as pessoas boas, dignas, honestas e integras que entrarem no meio jurídico estarão fora do esteriótipo? Será que NÃO ter o rei na barriga vai ser sempre uma exceção?

Do fundo do meu coração, a auto-estima do nosso meio me preocupa. Certa vez li que a arrogância é um caráter da personalidade retamente ligada à baixa auto-estima. Para se sentir bem, a pessoa que não se estima precisa sempre estar pisando nos outros para se sentir superior. Precisa de parâmetros de comparação para lembrar que venceu.

E infelizmente esse tipo de pessoa tem vencido. ´´Um dia pretendo tentar descobrir por que é mais forte quem sabe mentir´´ (e quem sabe enganar, e quem sabe pisar, e corromper, e trapacear, e puxar-saco).

Não gosto de conclusões pessimistas acerca do ser humano. Mas hoje o dia favoreceu que eu pensasse assim. O ego dominou o senso de sociedade. E não, eu não acho pouco.

8 de março de 2013

Ser linda é maravilhoso | Parabéns pelo dia da mulher

Oi, bom dia. Sim, feliz dia da mulher pra você também. Pra você mulher e pra você homem que adora mulher e pra você gay que é meio concorrente e meio melhor amigo da mulher.

Hoje é dia de comemorar as conquistas, as lutas do feminismo, as lutas contra o pseudo-feminismo, as conquistas políticas históricas, comemorar a liberdade sexual, a liberdade de escolher ser putona, se quiser. Comemorar que ser putona ou ser virgem não muda o direito ao respeito. Hoje é dia de comemorar a luta contra os padrões de beleza, a luta contra submissão no lar, contra o assédio nos ônibus lotados, contra os preconceitos no trânsito, contra a violência doméstica. De comemorar o acesso aos cursos de engenharia ou  ao prazer de ser a chefe do lar. De comemorar que não temos mais apenas louça pra lavar, mas também o pneu pra trocar, barata pra matar. E, convenhamos, receber a glória do direito de escolha, de ser fresquinha se quiser, ter medo da barata, ou não querer quebrar a unha na pia da cozinha e não trocar a lâmpada, também.

Ah, que maravilha, comemorar o sentimento vaidade que só a mulher sabe o que é, quando ela sai do salão de beleza com os cabelos maravilhosos ao vento, com poses dignas pra uma boa propaganda de shampoo. Que delícia, essa batalha que tem dado resultados: agora o cabelo pode ser curto, longo, loiro, vermelho, rosa, preto, liso, cacheado. Poder ser criola do olho azul ou loirinha do cabelo bombril. Pode ser tudo, de todo jeito dá pra ser linda. Pode ser veterinária e adorar meter o pé na lama, de botina e boné, e pode ser decoradora de interiores e ser miudinha, fofinha, meiguinha.

Pode tudo! Pode ser presidente do Brasil, pode ser jogadora de futebol, pode falar palavrão, pode gostar de outra mulher. Só não pode deixar de encantar o mundo com esses traços que só a mulher tem - e não por não ter permissão, mas por não conseguir.

Mas, ah, meus queridos, vocês que nos dão parabéns hoje. Esse parabéns tem um valor que vocês nem imaginam. Pelas conquistas históricas, pela importância na família, pela beleza, ok, ok. Mas aaaaah, quanto parabéns merecemos por suportar aquele palitinho embaixo da unha do dedão do pé toda semana. Quanto vale esse parabéns depois de assistir 900 vídeos da Julia Petit pra aprender a se maquiar e tchadam: não conseguir fazer nada. Quantos parabéns depois das dores do parto. E depois da escova no cabelo. E depois da tintura que não deu certo (de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!). Que preço tem um reconhecimento depois de acabar-se no tanque sem precisar quebrar as unhas. Quantos parabéns merecem as que suportam a cera quente!

Obrigada. Obrigada por não sermos as únicas a assistir novela. Obrigada por nos deixar saber que não somos sensíveis sozinhas. Obrigada por também irem à cozinha, mostrando que isso não é inferiorização, mas uma mera tarefa doméstica (muito sexy por sinal). Obrigada por terem cedido a tantas lutas, sem essas conquistas não teríamos o prazer de vê-los de camisa rosa. Parabéns, a nós, realmente, por termos conquistado um tempo em que não somos as únicas a fazer as sobrancelhas.

Obrigada por ter o nosso lugar reconhecido nessa sina dura e divertida do dia a dia. Um lugar nem inferior, nem superior ao de ninguém. Apenas um lugar com um pouco mais de glamour.