26 de setembro de 2013

Velejar

Era mês de agosto, baixa temporada na praia quando o Jangadeiro me levou a um passeio por 15 reais. Ele me apresentava as curiosidades do mar, passeando sobre as ondinhas daquele azul maravilhoso, mostrando o céu, os pássaros, a vegetação, a pedra no formato de cachorro, a outra no formato de coelho, mostrando os mariscos deliciosos que eu precisava provar e que tinha lá naquele bar da frente atrás dos coqueiros.

Ele usava uma bermuda e uma camiseta manga longa pra se proteger do sol, um boné e a pochete em que carregava o dinheiro dos turistas que pagavam pelo passeio.

Fui pra longe da praia, lá no meio da água onde estava fundo porque a maré estava alta e era inverno. E tudo me encantava. Me encantou o mar, o recife, os peixes, os barcos, aquele horizonte distante mais maravilhoso do mundo. Me encantava como tudo era extremamente azul, calmo e quente, como aquela pedra realmente parecia um cachorrinho no meio do mar tomando banho de sal.

Mas nada, nada me chamou mais atenção do que uma fala daquele jangadeiro, que entre muitas histórias que contava sobre aquele lugar, me soltou: "essa é minha profissão! Chego em casa todo dia estressado, cansado desse escritório, dessa gente feia, desse lugar feio! Hahahaha"

Reparei que quando ele riu, faltava-lhe uns dentes. Faltavam dentes, talvez um bom carro, talvez faltasse uma casa com mais conforto, talvez faltara até escola, mas não lhe faltava nada. Aquele homem não tinha nada e tinha tudo.

Voltei pra minha rotina e nunca esqueci da fala daquele senhor. Vai chegando o final da semana e o cansaço acumulado vai pesando sobre os ombros. Mas sempre me lembrando do Jangadeiro, no seu escritório; que com uma frase, uma brincadeira, me põe, até hoje, a enxugar umas lágrimas que caem quando eu me pergunto o que é realmente a felicidade.

E em busca de quê é esse esforço todo. E qual a razão de tantas metas. E por que os ternos. E por que os pronomes oblíquos. E por que o trânsito. E po rque tanta pressa. E qual a razão pra se chegar tão longe, se o azul do céu também está tão perto dos meus olhos.

Penso, me angustio, me renovo e burramente, sigo no mesmo ritmo. E sempre lembrando do Jangadeiro. Que com um honorário de 15 reais esfregou nas minhas fuças o que é um escritório bom de verdade.