27 de outubro de 2012

Era uma vez... o Joãozinho

Joãozinho era conhecido por todos. Era rodeado de colegas, todos sabiam o nome dele. Não é por que é "Joãozinho", entende? É que ele tinha isso de magnetismo. Os corredores viravam-se quando ele passava com seu sorriso brilhante, furta-cor, que furtava as cores todas do mundo e devolvia pra quem estava em volta.

Em volta, em torno dele. O mundo ao seu redor era radiante, cheio de gente. Muita gente transmite muita vida. É gostoso demais ser cercado de vida. De vida dos outros, que também é meio nossa, de sonho dos outros que às vezes se sonha junto. Joãozinho era assim, meio que sem querer, de repente, se pegava sonhando o sonho dos outros.

Diziam pro Joãozinho que ele era especial. Ele podia acreditar. Por que era o Joãozinho, aquele que tinha a todos e que todo mundo podia ter. Não era mentira não, o Joãozinho era assim, querido, um brilho saía dos olhos dele, uns olhos doidinhos por ver a vida se deixar viver daquele jeitinho gostoso.
Mas Joãozinho era ingênuo. Jamais saberia que aquela felicidade em torno dele era uma luz que um dia apagaria. Joãozinho era a Lua, que refletia a luz do Sol e do Universo inteirinho, mas não brilhava sozinho.
Não dava pra ver, mas Joãozinho era só. Na verdade eu via, às vezes, que Joãozinho pelos cantos suspirava sabendo que cada um era um só no mundo. Mesmo sem nunca Ler Guimarães Rosa Joãozinho sabia, assim, meio sem querer saber, que "cada um rema sozinho uma canoa que navega um rio diferente, mesmo que parecendo que está pertinho".

Era solidão aquilo. Nunca, alguém soube, nem ele, mas ter vida em torno de si não é o mesmo que ter vida por dentro. Ter em volta, ter por fora, isso não é ter, sabe? Isso passa, por que vem de lá, de longe.
Entenda, Joãozinho estava sempre assim, nessa ilusão de que tinha motivos pra sorrir. mas não eram motivos próprios. Não conte a ele esse segredo, não saber disso o faz sorrir.

Ele sempre ganhou muitos abraços, mas abraços que não tornavam-se vínculos. Joãozinho era de todos demais, era tanto de todo mundo que não teve ninguém. Ele tinha duas mãos, que não entrelaçavam-se em outras duas. Eram dois bracinhos finos, curtinhos, que de tanto tentar abraçar o mundo acabavam ficando sempre vazios.

É um segredo meu, agora um segredo nosso, ninguém mais precisa saber, mas Joãozinho, de tão feliz, era triste.

20 de outubro de 2012

A síndrome dos revolucionários-de-facebook



O nosso final de semana foi tomado pela indignação dos "cults" perante o fato de todo o Brasil parar em frente à TV pra ver novela. Mais grave: todo o Brasil parou diante da Globo, a emissora que manipula, faz sua cabeça e vende seus candidatos nas eleições. É motivo para um grande protesto à alienação daqueles que mais uma vez se deixaram levar pela mídia. Nossa, que pecado!

Parem. Fico com vergonha por vocês. Estava há muito tempo a observar essa moda besta de "ser revolucionário", "cult", "a nata da intelectualidade", "o herói que consegue ficar imune aos raios hipnotizantes superpoderosos da TV". É chique demais fazer protesto na cadeira de frente pro computador. Protesto que sustenta o ego, e não ideias.

É como aquela crítica feita no comecinho de 2012 por Bruno Medina, integrante dos Los Hermanos, à música de Michel Teló, que naquela época estourava na Europa. O músico desejou que Teló passasse um bom tempo em turnê, para que a música "ai se eu te pego" e sua dancinha parasse de infectar o "cérebro" dele e dos demais intelectuais do rock alternativo.

É o mesmo raciocínio, tolo, tosco. Poque assim como não se deveria viver acreditando só naquilo que a novela da Globo ensina, seria bom que também se buscasse conhecer músicas em que os instrumentos sejam bem elaborados ou que tenha uma letra boa, alguma crítica.

Seria bom. Mas não faria ninguém mudar o mundo. Não significa que há o direito de repúdio ao fato de um cantor preferir lançar músicas com o único objetivo de lazer e dancinhas de sábado a noite. Não é só o fato de a música existir que causa a alienação e o desinteresse pelos assuntos sérios do país. Quem se interessa pelos Direitos Humanos ou pelo caso de Malala não o deixou de ser só por que parou para ver a Carminha ontem ou quis dançar forró hoje. Quem nunca teve interesse ou instrução para ter este tipo interesse, está preso em toda uma mentalidade que está agregada ao histórico cultural de nosso povo. Não é atacando dois ou três programas da TV que alguém poderá mudar isto.

Quem entendeu a movimentação pelo fim da novela na sexta como "a grande manifestação do poder da Globo" fez alguma coisa pelas pessoas do nosso país que só tem acesso a este tipo de instrução? Ou preferiu ver mais um episódio de The Big Bang Theory?


Será que quem repudia as músicas que nada acrescentam ao nosso cérebro buscou convencer os amigos de não serem coniventes com as músicas que degradam a mulher ou que banalizam o sexo? Ou apenas continuam com orgulho ferido e ouvindo músicas que protestam o ontem como se isso mudasse o mundo hoje?

Parem com essa mania pobre de etiquetar a si e aos outros. Mexam-se em silêncio por algo que sustente suas ideologias e filosofias de vida, e sintam-se em paz para descansar a noite na frente da TV. Não vai os fazer uma pessoa pior. Só os fará menos hipócritas. Berrar aos 4 cantos de uma rede social dizendo que você é o revolucionário do século não é o mesmo que agir.
Cão que ladra, não morde.